Um olhar sobre o Avanço da Epidemia de COVID 19 em Campinas

Texto de Dra. Carmen Lavras, Médica Sanitarista, especialista em Planejamento e Gerenciamento em Saúde, doutora em Saúde Coletiva. Sócia Fundadora do IPADS, ex-secretária de Saúde de Campinas, foi docente do Departamento de Medicina Social e Preventiva da FCM da PUC Campinas durante 25 anos. Atualmente é pesquisadora do Núcleo de Estudos em Políticas Públicas da UNICAMP.

 

 

Estamos vivendo um dos maiores períodos de crise de nossa história recente, com forte impacto na vida das pessoas e na organização das sociedades em praticamente, todos os países do mundo, mesmo que de forma diversificada.

Essa crise acomete o nosso país, também de forma diferenciada, seja em função da diversidade regional existente, seja em função das profundas desigualdades sociais presentes em nossa sociedade ou, ainda, da forma como cada região vem conduzindo seu próprio processo de enfrentamento.

A crise, causada pela epidemia de COVID 19, exige, para seu enfrentamento, um conjunto de medidas de caráter individual e coletivo, particularmente, centradas na preservação da saúde e na proteção social.

E no curto período de sua existência, já podemos perceber, tanto em outros países como no próprio Brasil, um conjunto de iniciativas bem sucedidas que podem ser reconhecidas como “lições aprendidas”.

Nessa perspectiva, podem ser analisados entre outros, os processos de enfrentamento desencadeados pelos municípios de Florianópolis, Belo Horizonte e, Curitiba e, pelo estado do Rio Grande do Sul.

Em Campinas, assim como em vários outros municípios do país, vivemos um processo de isolamento social à praticamente dois meses, que impactam fortemente nossas vidas e a dinâmica de nossa sociedade, com a ressalva que nossos índices de isolamento variaram muito ao longo desse período, em parte, em função das mensagens governamentais tão contraditórias e diversas.

Porém, nesse processo de enfrentamento, Campinas se diferencia de muitos municípios brasileiros, já que pode contar com inúmeros recursos aqui existentes que devem ser considerados como grandes fortalezas.

Refiro-me a presença de: empresas e outras organizações da sociedade civil bem consolidadas; instituições de ensino e pesquisa robustas; organizações comunitárias e movimentos sociais organizados e atuantes; profissionais de saúde preparados e muito comprometidos; e, instituições de saúde em número expressivo e bem estruturadas.

Nesse momento, assiste-se em Campinas e em vários municípios da região, um importante aumento diário dos números oficiais de pacientes infectados e de óbitos, números esses com certeza subestimados, tendo em vista a falta de testagem.

Além disso, observamos, também nos últimos dias, um aumento significativo na ocupação de leitos hospitalares levando quase ao esgotamento leitos de UTI para portadores de COVID, nos principais hospitais que atendem o SUS na região.

Assim, mesmo reconhecendo que as medidas necessárias nesse momento para o enfrentamento dessa crise podem não corresponder a expectativa de uma parcela significativa da população que, sentindo de forma mais contundente o impacto econômico dessa crise, particularmente, relacionados as implicações desse momento de isolamento, almejam o retorno as atividades normais de seu cotidiano, ouso lembrar, que a flexibilização do isolamento social nesse período, no qual os números de infectados e de óbitos ainda estão aumentando dia a dia, pode trazer consequências desastrosas e irreparáveis para nossa sociedade, com perdas de muitas vidas.

Por outro lado, acredito que quando a sociedade sentir de forma mais próxima as consequências desse retorno precipitado, mesmo essa parcela que hoje almeja a rápida saída do isolamento, irá cobrar dos governantes as perdas de vidas daí decorrentes.

Dessa forma, entendo que hoje se faz necessário:

  • Manter e estimular o distanciamento social;

  • Ampliar a realização de testes diagnósticos (PCR) que sustentem ações mais efetivas de rastreamento e bloqueio;

  • Formular um plano de flexibilização acordado com os demais municípios da Região Metropolitana de Campinas, respeitando-se os indicadores e as orientações propostos tanto pela OMS como pela SES SP;

  • Formular um projeto robusto de proteção social, a ser articulado pelo Governo Municipal, mas que conte com ampla participação das organizações e movimentos da sociedade civil;

  • Aprimorar o processo de comunicação social com a sociedade, no sentido de facilitar o entendimento e buscar maior adesão as medidas propostas;

  • Definir medidas especificas e diferenciadas para as regiões com populações socialmente mais vulneráveis;

  • Ampliar, imediatamente, a capacidade de assistência hospitalar para portadores de COVID tendo em vista a superlotação dos leitos de UTI existentes; e,

  • Fortalecer a articulação regional para proposição de medidas conjuntas de enfrentamento da epidemia.

Quero acreditar que Campinas reúna todas as condições necessárias para, nesse momento, contando com o potencial de todas as forças sociais aqui existentes, ajustar seu processo de enfrentamento dessa crise de forma a responder adequadamente a uma realidade que se modifica a cada dia, imprimindo uma condução cientificamente bem embasada e socialmente responsável, buscando minimizar os riscos a que estamos todos expostos pela própria natureza dessa epidemia.

 

Imagem destacada  de fernando zhiminaicela por Pixabay
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